“Vamos”, “Segue” “Quero compromisso” (…). Num ato mais de discussão, deixo uma pergunta retórica:
Será que toda a gente interpreta da mesma forma, ou seja, e neste caso, que os jogadores de uma equipa interpretam da mesma forma o que o treinador esta a pensar/ idealizar?
O que podemos ter como base para trabalhar em termos práticos é a construção de uma maior operacionalização de conceitos. O emissor, por vezes, delineia bastante bem o que quer transmitir com expressões verbais. No entanto, há situações em que se utilizam conceitos muito “macro”, ou seja, mais abrangentes, em que, e neste caso, os recetores, ou seja, os jogadores, podem fazer uma interpretação de várias formas (1). O “vamos” será que é para ir para onde? Balneário? Linha lateral? Baliza? (…). E o “segue”? Segue a driblar o defesa? Segue para a frente? Segue para o outro flanco? (…).
O leitor, neste preciso momento, será que tem noção de quantas vezes disse “bom dia”, ou “olá” hoje? Por vezes, os treinadores, inseridos num determinado cenário, parece que adotam um pouco do modo “piloto automático”. No treino, acontece de forma semelhante. É bom ser-se automático nos trabalhos que se faz, mas acredito que não se alcança verdadeiramente o sucesso se não houver um bom processo até lá. Por vezes, há um foco excessivo numa determinada tarefa que leva ao esquecimento e à não perceção do que se passa ao redor. Neste momento, estou a focar-me um pouco mais sobre as competências da atenção e concentração, mais concretamente, no “versus” da atenção seletiva (que é um tipo de atenção focada em apenas uma determinada tarefa) e atenção distribuída (que é um tipo de atenção que requer o foco em mais do que uma atividade) (2).
Poderemos trabalhar sobre a operacionalização de conceitos, fazendo-o nos treinos e no dia-a-dia. “Treinar difícil para jogar fácil”. Quanto mais este processo for treinado, torna-se mais produtivo/ enriquecedor para a consequência de toda a mestria, ou seja, para o resultado. Depois, consoante o decorrer do treino comportamental, mais automatizado se poderá tornar a longo prazo. Haverá, assim, um processo de “Modo controlado VS Modo automático”, no qual se procede a um treino com o objetivo de operacionalizar o tipo de mensagem, para que esta seja interpretada da forma adequada e desejável, até se chegar novamente ao facto, de que, quanto mais treino existir, mais automaticamente será a longo prazo (1). De forma resumida, quando se começa a tirar a carta de condução, existe uma preocupação com vários fatores, como por exemplo: com a posição do banco, espelhos laterias, retrovisor (…). Contudo, depois de anos com carta de condução, essa preocupação não será a mesma de quando se iniciou esse processo. Há um processo de trabalho controlado a ser “transformado” em algo automático!
Por vezes, um simples gesto diz muito mais que mil palavras, e no contexto desportivo, isto nunca esteve tão correto!
Há que salientar notas importantes a treinar no apoio não verbal:
? Aparência Física;
? Postura;
? Gestos;
? Comportamento Tátil (Toque);
? Expressão facial;
De certo modo, tudo isto é importante para promover um grande suporte e influência, como líder de uma equipa de futebol!
Em seguimento do que foi dito anteriormente, será que, por vezes, definimos bem o nosso “pombo correio”, como ajuda para emitir a mensagem para os colegas?
Estamos no minuto 88 (de uma partida do escalão de sénior), e a sua equipa, está empatada por duas bolas e precisa muito de vencer aquele encontro. Nesse minuto, surge um canto a favor, no lado oposto em que se encontra. Suponhamos também, que o canto curto é prioridade e que a bola seja cruzada no sentido do primeiro poste. Enquanto os seus dois atletas se preparam para bater o canto, observa que é determinante não haver canto curto e que haja uma bola cruzada para o segundo poste. A emoção do jogo contagia bastante e a mensagem não está a conseguir ser “entregue” com sucesso. Com isto, observa outro atleta no meio do terreno que pode facilitar o processo e ajudar na transição da mensagem. A informação era: “Segundo poste”. A mensagem que esse “pombo correio” fez chegar aos companheiros que faria o canto curto era de: “Vai para o segundo poste” (isto para o companheiro que estaria para fazer o canto curto). Isto é um pequeno exemplo do que um simples pormenor se pode transformar num grande “pormaior”. O que pode ter originado este tipo de situação? O mensageiro não estar focado no que era dito ou a mensagem não ser dita com clareza? Os jogadores que estavam para realizar o canto curto interpretaram a informação distorcida? (…). Pode-se, assim, treinar este tipo de situação e outros pequenos pormenores em treino para ser aplicado em jogo.
De uma forma breve e resumida, e em relação à comunicação, esta pode ser caracterizada como sendo interpessoal e intrapessoal.
Comunicação interpessoal:
? Envolve uma troca entre pelo menos 2 pessoas. O emissor, de certa forma, tenta influenciar a resposta da outra pessoa.
Comunicação intrapessoal (discurso interno):
? Comunicação que temos connosco próprios. O que dizemos a nós próprios é muito importante e geralmente ajuda a moldar e a predizer a forma como agimos (1).
A comunicação permite a conexão com todos os membros da equipa, e o líder facilita, estimula ou impede a rede comunicacional. Algumas pesquisas indicam que o método “sanduíche” é o modo mais eficaz de críticas (4). O método sanduíche é uma técnica que permite fornecer feedback construtivo de modo simples e eficaz. Consiste em três elementos sequenciais:
1) Uma afirmação positiva.
2) Instruções elaboradas em relação ao futuro.
3) Um elogio (4).
Aplicações Práticas:
O “Escutar com os olhos” é uma ferramenta importante no processo mental do jogo. Algumas dicas passam por:
. Observar linguagem corporal para analisar congruência com mensagem verbal;
. Escutar ideias principais (ignorar pormenor);
. Remover distrações do ambiente;
. Esforçar-se por melhorar as competências de comunicação;
. Não julgar o orador pela sua aparência ou reputação, mas pelo conteúdo da mensagem (2).
Uma ferramenta importante para a otimização da comunicação, é o CBAS – Coaching Behavior Assessment System.
“A behavioral assessment system for coding and analyzing the behaviors of athletic coaches in naturalistic settings is described. The Coaching Behavior Assessment System (CBAS) consists of 12 behavioral categories derived from content analyses of coaching behaviors during practices and games. The manner in which coders are trained and the CBAS used in field settings is described, and the results of several reliability studies are reported. These studies indicate that high scorer accuracy and interrater reliability can be attained. The potential use of the CBAS to extend the study of interpersonal behavior into the realm of sport psychology is also discussed.” (3).
Referências Bibliográficas:
(1). Cruz, J. F., Dias, C., Gomes, R., Alves, A., Sá, S., Viveiros, I., Almeida, S. & Pinto, S. (2001). Um programa de formação para a eficácia dos treinadores da iniciação e formação desportiva. Análise Psicológica, 19(1), 171-182
(2). Hardy, C. J., Burke, K. L. & Crace, R. K. (2005). Coaching: an effective communication system. In Shane Murphy (Ed.), The Sport Psych Handbook. Champaign: Human Kinetics
(3). Rodríguez-Peláez, D., Garrido, P., Conde, C., & Almagro, B. J. (2015). Adaptación y validación de la CBAS para la observación de climas motivacionales. Cuadernos De Psicología Del Deporte, 15(3), 253-260.
(4). Weinberg, R., and Gould, D. (1996). Fundamentos de psicología del deporte y del ejercicio físico [Foundations of Sports and Exercise Psychology]. Barcelona: Ariel.